quarta-feira, 16 de março de 2011

Saúde materna: Brasil ainda sonha com melhores indicadores

FEBRASCO -  Novos programas e manuais do Ministério da Saúde não conseguem reverter os enormes riscos da gravidez no país

        Apesar de diversos programas e ações implementados no Brasil nas últimas décadas, a redução dos riscos à gravidez com conseqüente melhoria nos indicadores de saúde materna está longe de ser realidade. As mais recentes tentativas de reverter o quadro são programas de aconselhamento à gravidez - com ênfase em nutrição adequada, melhora da auto-estima, apoio social e redução de potenciais fatores de risco, como tabagismo, alcoolismo e drogas -, e o Manual Técnico do Ministério da Saúde Pré-natal e puerpério - atenção qualificada e humanizada. Este último, concluído em 2005, determina as condutas e intervenções mínimas para garantir atenção pré-natal e puerperal na gestante sem intercorrências.
       De acordo com a profa. dra. Iracema de Mattos Paranhos Calderon, professora Livre-docente em Obstetrícia, do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Botucatu/Unesp, para avançar nessa área são necessárias mudanças políticas, científicas e culturais:
       Com a grande difusão dos conhecimentos em saúde e educação, esperamos uma gestante que rejeite a atitude passiva de aceitar somente o que lhe é oferecido em detrimento daquilo a que tem direito, Esta nova postura certamente garantirá à paciente um atendimento de melhor qualidade”.
       A especialista, recém-nomeada presidente da Comissão Nacional Especializada de Assistência Pré-natal da FEBRASGO, defende que é preciso uma união nacional, um esforço coletivo de todos os setores, governamentais e não-governamentais, para a melhoria da qualidade da atenção pré-natal e puerperal.
                                     ASSISTÊNCIA NO BRASIL
        O Brasil registra ano a ano um aumento do número de consultas de pré-natal por mulher que realiza o parto no SUS. Em 1995 eram 1,2 consultas por parto, enquanto em 2003 o índice subiu para 5,1 consultas (SIA-Datasus e AIH-Datasus, 2004).
        Infelizmente, a análise dos dados demonstra comprometimento da qualidade da atenção. Isso pode ser evidenciado pela incidência de sífilis congênita, estimada em 12 casos/1000 nascidos vivos no SUS (PN-DST/Aids, 2002), ou pelo fato de a hipertensão arterial ser a causa mais freqüente de morte materna no país.
        “Somente pequena parcela das gestantes inscritas no Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento (PHPN) consegue realizar o elenco mínimo de ações preconizadas pelo Ministério da Saúde”, alerta a dra. Iracema.
        Este programa vigente atualmente, o PHPN, foi lançado peloMinistério da Saúde em 2000. A nova estratégia de ação veio com o objetivo de definir um modelo nacional que normatizasse as ações assistenciais relacionadas, conjugando esforços para melhorar os resultados observados.
         “O PHPN trouxe a discussão sobre as práticas pré-natais e suas bases conceituais, em consonância com os modelos utilizados em todo o mundo. Em linhas gerais, são recomendadas seis consultas, no mínimo, para cada mulher, sendo a primeira até o 4º mês de gravidez; uma consulta até quarenta dias após o parto; exames laboratoriais; além de classificação continuada de risco gestacional e atividades educativas”.
      Em avaliação preliminar dos primeiros anos desde a implantação do PHPN, a especialista ressalta a pequena parcela das gestantes cadastradas que pôde cumprir integralmente os critérios estabelecidos.
       “A maioria apresentou assistência desarticulada e parcial. E apesar de os indicadores de qualidade mostrarem melhora de um ano para outro, permaneceram baixos os percentuais registrados, ratificando a necessidade de permanentes ajustes, avaliações e novas intervenções, particularmente nas regiões mais carentes como Norte e Nordeste”.
        Confira alguns pontos destacados pela presidente da Comissão Nacional Especializada de Assistência Pré-natal da FEBRASGO.

NUTRIÇÃO

        “Caiu por terra o conceito de que a grávida deveria comer por dois, ou que não se deve estimular a manutenção da estética durante a gestação. A gestante precisa ganhar peso, em média de 8 a 14Kg durante toda a gestação, dependendo do estado nutricional. A necessidade calórica deve ser definida pelo IMC, avaliado no início do pré-natal, e pelo ganho de peso materno, avaliado em cada consulta de pré-natal.
          As orientações atuais também destacam a promoção da alimentação saudável, com enfoque na prevenção dos distúrbios nutricionais e das doenças associadas à alimentação e nutrição, tais como baixo peso, sobrepeso, obesidade, hipertensão e diabetes; além da suplementação de ferro, ácido fólico e vitamina A (para as áreas e regiões endêmicas). Em geral, as necessidades diárias são de 2800Kcal na primeira metade e de 3300Kcal na segunda metade da gestação. A composição da dieta é padronizada em 60% de carboidratos, 30-40% de proteínas (de preferência de origem animal) e menos de 10% de gorduras, evitando-se as não-saturadas”.

PARTO PREMATURO

         “No Brasil, PPT é um problema de saúde pública. É alta a prevalência de gestações de risco e a prematuridade atinge cerca de 20% delas, metade relacionada ao trabalho de parto espontâneo. A detecção precoce do risco de PPT é o caminho possível para a prevenção, por meio de repouso, circlagem, antibiótico e uso de progesterona de forma profilática. A progesterona natural parece promissora por bloquear as ações da ocitocina e da prostaglandina F2a, a estimulação adrenérgica e da resposta de tocolíticos a-adrenérgicos. Diferentemente da progesterona sintética, a progesterona natural não causa qualquer efeito teratogênico, metabólico ou hemodinâmico.
          A literatura tem poucos estudos e resultados controversos sobre os efeitos da progesterona, natural ou sintética, administrada por via intramuscular, na prevenção do PPT. A progesterona natural parece promissora na prevenção do PPT em gestações de risco, entretanto seu uso comercial ainda está muito aquém de nossas necessidades”.

GESTAÇÕES MÚLTIPLAS

        “A grande novidade é a discussão da via de parto de menor risco materno e fetal nas gestações gemelares próximas ao termo. O motivo é o fato do segundo gêmeo (gêmeo B) ter maior risco de morte e/ou morbidade neonatal severa comparado ao primeiro gemelar (gêmeo A) em caso de parto é vaginal, o que não acontece na cesárea. Um ensaio controlado aleatorizado multicêntrico e internacional, denominado TBS (Twin Birth Study), está sendo desenvolvido com inclusão prevista de 2800 mulheres em quatro anos.
         Serão avaliados mortalidade perinatal ou neonatal e/ou morbidade neonatal severa, desenvolvimento neuro-psico-motor dos recém-nascidos a curto e médio prazos e custo hospitalar. Os resultados auxiliarão obstetras e outros provedores de saúde no aconselhamento de mulheres com gravidez gemelar sobre os riscos e benefícios das diferentes vias/abordagens do parto”.

GESTANTE SOROPOSITIVA

        “A prevenção da transmissão vertical do HIV foi, sem dúvida, um grande avanço na assistência pré-natal, em destaque no protocolo de atendimento das gestantes HIV+ do Ministério da Saúde do Brasil. Este protocolo estabelece o uso de antiretrovirais durante a gestação e, sempre que possível, a zidovudina (AZT) deve compor o esquema de tratamento.
        A via de parto deve ser planejada de acordo com a contagem de carga viral aferida com 34 semanas de gestação, com indicação de cesárea eletiva quando a carga viral nessa idade gestacional for maior que 1000cópias/mL. Este protocolo define ainda recomendações para manejo do parto normal na gestante HIV positivo e na assistência ao puerpério dessas mulheres”.
                                                               
AMAMENTAÇÃO

       “Durante os cuidados no pré-natal, é importante conversar sobre as vantagens do aleitamento materno para a mulher e a criança, e orientar sobre o manejo da amamentação. Durante as consultas, deve haver avaliação das mamas e orientação para a gestante sobre o uso do sutiã.
        São recomendados banhos de sol nas mamas por 15 minutos, até 10h ou após às 16h, ou banhos de luz com lâmpadas de 40 watts a cerca de um palmo de distância. Sabões, cremes ou pomadas no mamilo devem ser evitados, e contra-indicada a expressão do peito durante a gestação para a retirada de colostro.

PARTO NORMAL X CESARIANA

        “No Brasil, cerca de 36% dos nascimentos são por via alta. Quando tomamos como referência hospitais particulares, estes índices são ainda maiores, chegando a 90%. Cerca de 850 mil cesarianas desnecessárias são realizadas anualmente na América Latina. Nesse contexto, algumas ações foram definidas para prevenir a cesárea desnecessária em nosso país. O próprio PHPN e as normativas do Ministério da Saúde para conter os índices de cesárea no SUS são algumas delas.
        Mais recentes, a resolução da ANVISA (Agência de Vigilância Sanitária) RDC 36, dispõe sobre Regulamento Técnico para Funcionamento dos Serviços de Atenção Obstétrica e Neonatal, enquanto a instrução Normativa nº 2, de 3 de junho de 2008, dispõe sobre os Indicadores para a Avaliação dos Serviços de Atenção Obstétrica e Neonatal. Ainda assim, com a implementação destas normas, para os resultados esperados na prevenção das cesáreas desnecessárias temos um longo caminho a ser percorrido”.

http://www.febrasgo.org.br/?op=300&id_srv=2&id_tpc=0&nid_tpc=&id_grp=1&add=&lk=1&nti=35&l_nti=S&itg=S&st=&dst=3

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